Fui ontem jantar com o meu avô, mais uma daquelas
francesinhas que apenas são o pretexto
do gosto tripeiro para o encontro das gerações e dos tempos.
É uma bênção partilhar a mesa com ele. O meu avô é
daqueles poucos homens que o Tempo esqueceu e em que a Vida o teve sempre
presente. Dizia-me ele ontem que me via agora na faculdade e que se revia em
mim, por entre a calçada do coração da Cidade, pelas ruas que vão escondendo as
sombras da Invicta, pelos trajes e capas negras que guardam a noite, pelas
luzes sobre o rio que espelham pontes sem horizontes. Tem quase mais 60 anos
que eu, e sinto aquela cumplicidade de amigo, de companheiro do Caminho.
Falávamos que há coisas estranhamente intrigantes. Tudo na vida dele, podia ter
seguido facilmente outro rumo, outro Rumo! Rumo esse que podia fazer com que
aquele jantar ontem comigo não acontecesse.
A linha que separa a vida e a morte é demasiado ténue
para o entendimento humano e a escolha resulta sempre em consequência. Somos
mais feitos de dúvida e decisão, do que de entendimento e conhecimento.
E é exatamente isso: um dia a mais ou menos em
Angola, um centímetro mais à esquerda ou à direita, uma pedra mais presa ou
solta no Caminho, e a vida como a conheço ou ele a conhece não era sentado um
frente ao outro na mesma Mesa.
Acho isso incrível...
Incrível porque nós, a infinitésima parte de Deus, vemos
a vida e a morte, os caminhos a serem cruzados e separados e somos
completamente impotentes. Somos apenas um pedaço do azul do céu...
Percebemos muito pouco do que somos e de onde
viemos... Resta-nos tentar saber para onde vamos...
E no entanto é apenas e só uma francesinha...
O meu neto é um espetáculo.
ResponderEliminarEntre o avô e o neto existe uma grande cumplicidade.
Caminhamos lado a lado como se a diferença de idades não existisse.
A francesinha estava de acordo com a potencia da grua...
Um abraço do Avô